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31 agosto 2020

virei um jakalope

De acordo com algumas argumentações de pessoas feministas que excluem pessoas trans a.k.a. TERFs - criaturas nada mitológicas e imaginárias que infestam os cantos de nossos convívios e são um perigo constante com suas ideias beirando a supremacia branca e fascismo, muito legal isso dentro do feminismo - quando uma campanha de marketing de empresa de coletores menstruais decide usar o termo "pessoas com útero" está automaticamente excluindo "mulheres de verdade".

Porque também de acordo com essas mesmas pessoas, "mulheres de verdade" se reduzem ao fator terem útero e menstruarem com esse útero. Realmente não dá para entender qual o ponto, afinal.

Então eu, assim como milhares de outras pessoas nesse Brasil - que tem problemas uterinos e que podem ou não ter tirado esse complexo cisteminha de hormônios ensacado entre os rins de um corpo denominado "mulher de verdade" - estamos em um mundo paralelo ao mundo real delas.

Bem, sempre acreditei nisso desde criança, que algumas coisas bizarras que aconteciam no mundo real, dominado pela cultura hegemônica cisnormativa patriarcal, iria criar uma realidade alternativa para as pessoas que não se encaixassem na descrição do cenário. De vez em quando dá para tatear essa realidade alternativa, nesses últimos meses tenho feito essa peregrinação nessas terras, é um lugar seguro e sólido. Quero ficar por aqui para sempre.

Mas voltando a argumentação das "mulheres de verdade"... Se eu não uso mais meu útero ou menstruo mais - e realmente não irei mais - logo não existo. Ou existo nesse mundo paralelo onde as pessoas cis, infelizmente as mulheres cis em sua grande maioria, vão clamar que não sou alguém apto para habitar o mesmo espaço-tempo que elas. Algumas irão ser radicais e dizer que mereço morrer ou levar um estupro corretivo para "voltar" a ser "mulher de verdade" (então esse conceito adiciona punição humilhante ao corpo para ser aceito na realidade onde elas vivem... Hmmmmmm, será que é em algum lugar do medievo, talvez antes das inquisições, ou sei lá). Realmente é difícil de entender como essas "mulheres de verdade" constroem argumentos para viverem...

Esse é um Jakalope. E é da animação Pular da Pixar (2003)

Mas como sou pacifista (trouxa e frouxa) e não gosto de ver ninguém brigando, ainda mais se for com úteros de outrem (o meu deixa em paz que ele já causou danos perigosos), decidi que sou um jackalope.

Eu poderia escolher qualquer animal mítico do folclore brasileiro, sinceramente, boitatá pra mim sempre foi incrível, mas não encontro nenhum que denote a questão de transição a não ser esse coelho rombudo com chifres de veado e que tem propriedades alucinógenas ao ser visto. O chifres de veado foi tudo na minha escolha, adoro. 

Logo como jackalope devo dizer que o mundo dessas feministas radicais parece ser um lugar bem ruim de se habitar com tanto rancor, mágoa e ódio destilado pelas suas bocas, quando se era necessário um movimento contrário contra quem as oprime. Opa, nos oprime. Nos oprime? Não sei se o patriarcado violenta jackalopes - talvez sim, talvez não - mas ser solidário à luta também é essencial para demonstrar empatia, né?

Mesmo que seja TERFS tratando pessoas não-bináries e homens trans como lixo por conta de uma propaganda de coletor de menstruação. O sagrado feminino tá aí, namastê, para nos condenar, nós, milhares de unicórnios/jackalopes com útero, mas não condizendo a expectativa da fêmea fértil. Para todas as mulheres de verdade que então sofreram com câncer de colo, HPV, e outras doenças, para as que chegaram na menopausa, corpos estranhos habitando esse conceito de "mulher de verdade" com útero funcional para reprodução.

O meu já foi pro saco, controlado quimicamente agora e engoliu alguns meses da minha vida, me fazendo rever todas as opções que eu tinha para me manter nessa realidade. Tirou algumas esperanças também, abriu um ralo sem fundo para três pacotes de transfusão que me assustaram pra caramba (eu desejei intensamente que fosse alucinação, não foi) - então para esse complexo sisteminha de caldeirão hormonal que não mais funciona direito conforme as normas tácitas de uma convenção anciã de "mulheres de verdade" (e que excluem pessoas trans, ah vamos chamar de TERF mesmo, porque eufemismo é pra se gastar em ironia, não em apontar os dedos pra quem nos mata), eu sou uma pessoa inválida.




Logo jakalope. 
Olha só como ele é fofinho. 
E veadíssimo.

Prefiro assim do que passar vergonha em rede social destilando discurso de ódio, coisa mais péssima isso não direcionar a raiva pro capitalismo, tsc tsc. 

04 julho 2020

o Tempo e o tempo

Ocorreu que em algum dia nublado naquele auditório da universidade dos Stormtroopers uma aula de literatura seguia com a excelente explicação sobre tempo e narrativas. Você veja só, o Tempo dito pela capeta-lismo é uma incógnita de 24 horas, 7 dias por semana condensada em 44 horas semanais de trabalho forçado para manter a máquina pulsando e jorrando óleo pegajoso na geração seguinte. Foi-se assim que na discussão entre as diferentes narrativas entre a africana e a ocidental, descobri que o Tempo era uma convenção não tão estabelecida assim.

Eu sempre tive a percepção dele em relação ao meu corpo como um eterno jogo de coelho branco da Alice no país das maravilhas - o camarada que vivia atrasado, sabe? - então desde que me entendo por ser autômato na máquina oleosa, o Tempo significou muito pra mim, ainda mais na questão de NÃO perdê-lo.
Creepy as fuck já te isso internalizado desde meus 11 anos.

Então naquela aula, ao quebrar esse paradigma que eu defendia com unhas quebradiças e dentes molares, saía das aulas com a impressão de que a Vida era um trem tão bizarro que eu deveria parar de contabilizar ela de alguma forma. Funcionou por um tempo, até a máquina oleosa cuspidora de peças me dizer que tava errada. Ela te engana fácil.

Tempo cortando as asas do
Cupido (1694), por Pierre Mignard


O Tempo em si pode variar em vários momentos da vida, os meus tem sido perceptíveis na mudança de ritmo em tempos em que fico doente, ou quando arranco aos poucos (aos murros ou com um canivete enferrujado) uma flecha desviada que o guri estrábico e sem noção, filho daquela que não deve ser nomeada no panteão helênico - que é totalmente oposto da explicação de narrativa que me livrou de protocolos em pensar o Tempo como um ser apressado, angustiado e devorador de seus filhos. Na doença, no desamor e na medicação forçada percebo que isso tudo cessa e um novo ritmo bizarro de vida se propõe sem pedir licença alguma. Apenas chega. Eu que me vire para tentar me adaptar.

05 agosto 2019

compartimentando personas

Heeeey meu 2º morador favorito do Hades¹!
Em meu mundinho ideal pessoas entenderiam que sim, dá para compartimentar vivências como a gente guarda comida em tupperware e só abre quando precisa ou tá com fome.

O que sou na vida real (IRL = in real life) não é a mesma coisa que sou nas interwebs que também não tem nada a ver com o que sou quando estou jogando MMORPG e gezuis amado barbosa da silva, não confundam com meu eu-lírico, muito menos com meu fazer bibliotecário.

Compartimentar caracteres e estados de vivência faz um bem danado, cês não sabem como. Primeiro que delimita sujeitos e discursos, dá a vantagem de prever como certas situações irão se desenrolar - sabe aquele papinho de "papéis sociais", bem isso - e o mais importante pra integridade da minha pessoa: separar público do privado.

Porque infelizmente nesse antro vil e maléfico de Cthulhu - também conhecido como bolha acadêmica da universidade dos Megazords ou qualquer outra instituição em que te fragmenta ao ponto de quebrar e dissolver, mas quer que você continue em um pedaço só para fingir que tá de boas nessa confusão - pessoas não aprenderam ainda separar o público do privado. E eu tento, juro! Todos os dias vigiando qualquer derrapada pra não confundir ou interpretar falta de profissionalismo com falta de semancol. Faço a minha parte, como uma pessoa treinadinha desde quiança a não vacilar nos escorregos do misturar as personas e acabar causando mais outra situação embaraçosa.
(Podia dar um exemplo explícito aqui? Podia, mas acho que os bafões acadêmicos devem virar lenda urbana naquele espaço tão elitista de certo centro que abriga certo departamento de certa universidade... aaaaaah vocês entenderam aí!)

Assim como os lindos, civilizados, politeístas, escravagistas e xenófobos gregos faziam, separar o público do privado descomplica tantas coisas que pelo jeito a galera do Iluminismo esqueceu de resgatar junto ao Parnasianismo e o Narcisismo Acadêmico. Separar essas duas tipologias de personas é essencial para a manutenção de uma saúde mental intacta.

(Aliás, fun fact: a persona é o papel social do ator do teatro grego, eles costumavam usar máscaras para separar quem eram de verdade, do personagem e do eu-lírico ali expressado. As pessoas não entendiam bem quando alguém interpretava um papel no teatro, às vezes confundiam o ator com o personagem que ele interpretava e rolava uns bafões do tipo, literalmente levar a sério a interpretação e alguém da plateia ir lá tirar satisfações com o ator como se ele fosse o personagem. Fantástico!)

Então vamos falar de personas e separação de público e privado e como isso faz bem?
Não sei quanto a vocês, mas é bom dar uma revisitada em todas as máscaras que guardamos toda vez que temos que nos submeter a situações sociais que nos impõe diferentes meios de se comunicar e de existir.
(Tá na hora do mindfuck de final de semestre?! Táááá sim!)

Debaixo do link: se não tá a fim de dar uma olhada para si mesme, nem clica.
(Mas tá sendo engraçado descobrir que na verdade meu perfil profissional é de extrema filhadaputice burocracia por simples gosto de querer complicar a vida de quem vive prejudicando os outros)

11 julho 2018

mais um semestre, menos um semestre

Começo com um gif fofuxo da Tay-tay, sou dessas pessoas...


PASSEI DE SEMESTRE!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
E que novidade é essa, afinal, mas era mais esse pra entrar no famoso TCC.


O que eu aprendi esse semestre:

  • Que usam a palavra interdisciplinar de forma equivocada querendo chamar de multidisciplinar. 
  • Que confundem bastante os verbos ser e estar. 
  • Que se o mundo caminhar para um Apocalipse Zumbi e então revolução das máquinas, minhas habilidades em processamento técnico não irão salvar o meu traseiro. 
  • Um trabalho de REC escrito à mão em 10 páginas pautadas foi mais esclarecedor que todas as aulas de gestão que tive obrigação de ver (surprise modafócas? Até o povo da Adm odeia o trem de gestão). 
  • Queria voltar a ter paciência extra com as pessoas, mas percebi que a cota mínima estourou antes dos meus 26.
  • Bibliotecas escolares vão revolucionar o mundo, escreve isso aí e espere bonitinho.

28 junho 2018

Orgulhe-se

Orgulhe-se
É que estou lendo durante o dia todo
Um atrás do outro
Orgulho-se(mpre)
Duvidando da própria existência 
Orgulho, sinta
Negando sua identidade 
Orgulho, tenha
Das várias vezes que foi obrigada a sorrir e deixar o comentário odioso passar despercebido, que não destruiu parte da sua voz e ficou impregnado em seu coração 
Orgulho, viva(se)
Escondendo pelos cantos, vigiando ao redor, olhando de soslaio para ninguém perceber 
Orgulho de amar
Segurando a mão da pessoa certa e pedindo para todos os protetores divinos invisíveis para ninguém errado ver
Orgulho, seja
Sendo invisível pra não causar constrangimento, não fazer mais outra família se colocar contra alguém que não sabe se defender ainda
Orgulho, de cabeça erguida
Ouvindo pelo telefone ameaça de autoridade, de sacralidade, de parentes a vergonha que os causou, a expulsão de casa, a condenação a solidão
Orgulho, de cabeça baixa
Desviando dos olhares desejosos, porque é errado, tá errado, tudo tão errado em olhar
Orgulho, siga em frente 
Pra um futuro próximo que arrasta alguém adoecido pelo não-Amor, a intolerância, o orgulho ferido da vergonha social que os causa, os maltrata
Orgulho, sinta orgulho 
Arruinando qualquer relação posterior por morrer de medo de chegar muito cedo, muito tarde, chegar muito perto, afinal
Orgulho era o que eu devia sentir?
Sentindo orgulho de quem verdadeiramente sou
Escondendo por proteção 
Sobrevivendo por obrigação 
Desviando do trânsito transviado 
Transitando entre um mundo que vê um e outro, não vê apenas ser único 
Orgulho eu devia sentir
Esperando apenas mais outro dia passar
Com os dias contados nas estatísticas 
Nas enfermidades, nas perícias, nas imprecisões jurídicas, nas redes afetivas, tóxicas, ilícitas 
Orgulho de alguma coisa aí 
Continuando a ser chamado de aberração, destruidor de famílias, o plano C, a última opção, o estepe, "até namoraria você, mas as pessoas não vão entender" 
Orgulho de mim mesmo 
Pra chegar a esse ponto de escrever sem querer chorar, tremer as mãos, enterrar a cabeça no peito e pedir pelo amor de algo sagrado aí "o que que eu fiz de errado? por ser assim? por quê não sou como os outros?"
Orgulho, sinta 
Orgulhe-se sempre
Deixa eu viver em paz, além dos 35, um pouco mais?
Vê se me deixa em paz? 
"É só uma fase, vai passar..." 
"Não te criei pra ser isso não" 
"Não deixa ninguém saber, não quero passar vergonha." 
Tenha orgulho de si próprio. 
Um mês inteiro para fazer os outros entenderem que também faço parte desse mundo como elas também.
E todos somos temporários nessa existência.

06 junho 2018

empirismo não me decepciona

Empirismo não me decepciona

Além do sarcasmo e da apatia, algo que me rende bons frutos (e menos ansiedade, dores no corpo e afins) é o empirismo condicional da vida corrente.

E como qualquer criatura ansiosa e insegura, é de lei que irei me basear na vivência mundana através de fatos e não de lados. Porque lados há muitos, se apenas vemos em 3 dimensões, miguxe, experimenta passar dias em medicação forte pra ver o quanto de percepção a gente capta em poucos segundos de observação.

Já fui trouxa, admito com certo orgulho, pois a trouxice me ensinou a medir empiricamente os limites entre a minha realidade e a do Outro, essa esfinge inabalável com charadas ferinas na ponta da língua e muito silêncio constrangedor.

Diferente de Édipo e Perseu, não tou nem aí em decifrar charada pra ir adiante, prefiro bater aquele papo com a Medusa, ser tão estimável e subestimado na categoria de "monstros da mitologia" - lembrando que a Medusa foi amaldiçoada por Atena, sim aquela deusa da "Justiça" que esqueceu o detalhe básico de que a moça antes humana estava sendo assediada constantemente e então violada por Poseidon no templo dela.

Conversar com a Medusa traz solidez (bora começar com os trocadilhos?!), traz convicção, traz sinceridade. Olhar em seus olhos mágicos e instantaneamente se petrificar com o fato ali dado: não adianta fazer muita coisa se só vai quebrar a cara.

Então, em certa situação, vamos dizer, em que pai e filho, encarcerados em um Palácio estonteante no meio de um labirinto de desespero, têm a brilhante ideia de construírem asas enormes de penas resistentes coladas com cera para escaparem dali para a liberdade. O pai preocupado com o filho avisa que podem haver consequências graves se voarem muito perto do Sol, mas o ímpeto do filho (éesua admiração/curiosidade ao deus-sol) é tanto que é certo sua queda fatal.

Pai em luto esquece sua invenção, sua liberdade, sua promessa de felicidade para reaver o defunto do filho tão jovem, tão cheio de ideias, de sabores, de amores, de projetos e planos. Foi assim que Dédalo e Ícaro terminaram, o guri estropiado indo pro Hades, pai se sentindo eternamente culpado por não ter contido o episódio funesto, mesmo sabendo das consequências de se fabricar asas coladas com cera.

Se substituir pai por minha vontade de criar e filho como as ideias que costumava ter, temos esse paralelo super bonitinho para se deliberar. Engessamento nas práticas dentro de um ambiente educacional mata mentes criativas. O excesso de ordem e progresso mata quem precisa se expressar constantemente em forma de atuação direta com a sociedade. Sonhos são esmagados ao darmos a autoridade maior ao sol e não quem produz as asas com cera.

Não foi isso que me obrigo a acordar todos os dias, mas tá sendo o default.

Mas como sempre, toda vida, porém, contudo, o capitalismo tem uma vozinha de sereia atacando a nau de Ulisses: se hipnotizar com a harmonia do sistema e se afogar com sua falácia até findar mais outro Ícaro.

E ver Ícaros caindo tem sido constante nesses últimos tempos, e dói mais quando a cera usada nas asas deles também é base pra minha. A qualquer momento o sol/Hélio pode muito bem chegar e decidir aumentar de temperatura, esquecer das ordens de Apolo e me transformar em torresmo. E ele vai, essa é a certeza.

Então antes de acontecer: se aprochegue a miguxa Medusa. Mais precisa e com um toque de realidade. Um exterior esculpido em pedra, para quê voar se minhas asas estão debaixo dessa carapaça petrificada?

O mais importante: por que ter asas se a esfinge está apenas esperando abocanhar suas palavras, seus sonhos, suas ideias, sua criatividade com as intermináveis charadas?

Por que tentar se o padrãozinho medíocre sócio-instalado e sufocar até a morte quem desvia do normal?

Pra que entrar em desespero com isso?
Pra modiquê perder noites de sono, suco gástrico estragado, tentativas de interação e buscar aprovação se NÃO É ESSA A RAZÃO de aceitar a missão?

Conviver com esfinges, minotauros, reis megalomaníacos, deuses abusivos, Dédalos e Ícaros está perfeitamente encaixado no meu empirismo. Relevar a importância deles em minha vida pessoal/profissional é que está sendo novidade. A conclusão geral de mais um episódio desse teatro que insistimos chamar de vida?

Mantenha a vida pessoal LONGE da profissional. 
Faça o que a função pede. 
Não seja idiota em achar que vão dar a mínima (não irão). 
Você é um mero parafuso no mecanismo, seja invisível.
(Tá sendo ótimo, empirismo nunca me decepcionou ao me distanciar do objeto de estudo)

07 novembro 2017

a privação predatória

A tradução tá bem por cima, gente, mas a mensagem... Foi realmente lá onde queria chegar quando penso nessa de socialização de gênero e vivência como pessoa não-binárie e sim o que ando lendo sobre experiências das pessoas nisso tudo - se substituir algumas coisinhas ali, encaixa direitinho em como muit@s vivem.

~ Todas as lésbicas com que falei concordam que uma das coisas mais humilhantes e desmoralizantes é ter uma garota hétero pensando que você está (conversando) vindo até elas simplesmente porque você gosta de garotas e isso ... realmente ferra com nossos relacionamentos platônicos e românticos, porque enquanto as outras garotas se sentam nos colos das outras, e dormem nas mesmas camas e pegam na bunda umas das outras por diversão, estamos colocando tantos muros apenas no caso de nossas amigas héteros (não) acharem que estamos atrás delas.
e por nossa concepção de relacionamentos com outras meninas em geral é tão fodido e reprimido que não temos idéia de como navegar em nossas emoções quando realmente nos atraímos por uma garota e queremos chegar perto.
Vocês reblogando com "as meninas hétero / caras gays experimentam isso também" ... .nah, isso não é sobre pessoas que pensam que você as quer, é uma experiência excepcionalmente atrofiante para lésbicas que estão excluídas do desenvolvimento de amizades e se comportando ao redor de outras garotas de formas em que todos somos socializadas para (entender que), porque nos julgamos / os outros nos julgam como "predatórias"




Esse tópico me é particularmente delicado por ter/ser/absorver esse julgamento de "predatório" sem ao menos fazer jus ao título. O que a heteronormatividade compulsória nos obriga a ter papéis bem distintos e quadradinhos na socialização em grupos específicos, entre os potenciais pares do LGBT apenas consigo visualizar esse distanciamento entre forma de expressar seus sentidos/pensamentos e a forma como é o entendimento exterior.

29 outubro 2017

interlúdio pra hipocrisia

Vou falar mal da minha própria postagem, porque tou no direito.

Estava a deliberar - devido um puxão de orelha lindo ao corrigir um texto muito legal de uma colega sobre branquitude, rasura do sujeito e políticas discriminatórias que nosso país anda (re)vivendo - algumas opiniões que carrego comigo há um tempo sobre a questão de privilégios sociais.

Isso bate perfeitamente em como enxergamos as pessoas em nosso convívio, tanto para o bom quanto para o ruim. Me vem a mente também um discurso awesome que a fessora Mestre Jedi mais awesome (redundância É aceita nesse caso) que tenho fez na turma de formatura em que eu deveria estar formando esse ano, pois a questão de privilégios causa embaraço, envergonhamento, intimidação. Ela partilhou desse texto um tempinho antes de finalizar e perguntou até em que medida estava cabível para não alarmar as sirenes piscantes ululantes de certos círculos.

Aí lá vou eu escrever uma postagem sobre enrustid@s, um lugar/estado em que me senti pertencente por muito tempo devido ao não privilégio de algumas sensações carnais proibidas pela sociedade vigente, mas ao mesmo tempo me dando um privilégio - ao não sentí-las - de entender melhor quem são os Outros. Sim, esses do Sartre, aqueles que são o Inferno.

Ao reler o texto anterior desse blog - e não pensem que não faço isso com frequência, é uma ferramenta para eu tecer novas amarras e tecituras, achar onde estavam meus nós e desatar algumas ideias presas, as ideias enrustidas, here we go again, são o meu maior pesadelo acadêmico - senti que fui um tanto incisiv@ em tocar no assunto sem antes haver um ruminamento de como isso poderia de alguma forma ofender alguém.

E ofendeu.
Então, assim - vou me autocensurar e botar debaixo do link pra carapuça só servir pra quem apertar. Faz menos estrago e a minha própria carapuça se autoajusta.

Hipocrisia, a gente vê por aqui nesse blog também.
(Ninguém escapa!)

02 outubro 2017

onde foi que o erro começou?


Era uma bela manhã de começo de semana. Tudo estava certo e sob controle. Os passarinhos cantavam, o sol brilhava pálido em um céu coberto por grossas nuvens de uma possível chuva para a tarde. Dava pra ouvir o ruído incessante do mundo revolver a terra, o ar. Com uma banana já machucada do tempo guardada e deixada em cima do tampo da bancada, não percebeu que o dia começaria com vida. Seis na verdade. Pequeninas vidas cobertas de pelos, da mesma classe mamallia, ordem primates, pequeninos em suas constituições, vorazes no devorar a pequena banana meio amarela, meio preta. Comida afinal.

O menorzinho era o que arrancava mais pedaços, ávido pelo alimento, por não querer passar mais fome, não se sabe o que se passa na cabeça de primatas irracionais com um nome científico tão diferente. Era manhã ainda, as cascas detonadas retiradas, despojos do banquete dos seis atentos a qualquer outra oferta de alimento. Melhor fechar a janela para não entrarem em lugar que não pertence a eles.

A cada janela fechada, um olhar curioso. Os cinco maiores em volta do pequeno, como uma proteção na couraça daquele que deveria receber mais atenção para seu crescimento.

Todos nós crescemos algum dia.
Uns com proteção de cinco poderes.
Outros com a repreensão de cinco carrascos.

Era para ser uma manhã normal, café passado, mágoas internas a remoer, aquela frase mal escrita que ruminada várias vezes causa indigestão em sua entoação. Tudo funciona maravilhosamente do lado de fora, esse sistema de fingimentos tão elaborado.

Um belo teatro de tragicomédia que ninguém quer admitir que também já foi ator.

A primeira pedra no teto de vidro é jogada por seres racionais, nada de micos em busca de bananas meio apodrecidas. O que chamam de gatilho entre os meios de proteção, se torna vergonha, humilhação, doença. Onde foi que o erro começou?

É assim que nos observam na maior parte do tempo.

04 agosto 2017

As mesmas razões


Há coisas que me pergunto volta e meia, como saber se o mesmo motivo de alguém entornar uma garrafa de vodka barata ao meio dia no meio da semana é o mesmo que sufocar todas as emoções em ser um autômato em uma sociedade que não vai te aceitar mais. 

O bêbado do Pequeno Príncipe sabia o que tava falando

Talvez seja pra comemorar, talvez seja pra esquecer , talvez pra se esquentar, mas era meia garrafa de vodka barata ao meio dia de uma segunda-feira. Então, moradores de rua, ou pessoas em situação de rua.


Sempre lembro dessa velhinha andarilha errante que apareceu no albergue do vilarejo-brejeiro um dia, ela com mais de 70 anos, eu só com 19 e a pergunta: "Por que saiu de casa?

Porque ela não aguentava mais viver encarcerada em casa, servindo de empregada pros filhos desempregados, foi viúva cedo, morava lá pra cima. Norte de Minas? Não, nordeste, norte de lá. Veio andando, porque gostava de andar. Explicação simples.

Me foi permitido apertar a mão ossuda dela, desejar boa estadia na casa de passagem, ela foi ver o terço na TV católica local. Eu voltei pra casa me perguntando o que fazia uma senhora daquela idade andar sozinha por tanto tempo sem parecer que sofrera tanto. Por que alguém faria isso?! Minha mãe deu a notícia que o as depois ela aceitara a passagem de volta pra casa. Ninguém viu se pegou mesmo o ônibus ou chegou lá mesmo. Uma página virada, outro número no estatístico. 

11 anos depois de sentar ao lado da velhinha pra almoçar no albergue onde minha mãe trabalhava, noto que eles se amontoam  ao redor de prédios públicos como Assembleia Legislativa, monumentos históricos. Por que alie não em outros lugares? 

(FYI já ouvi de um morador de rua lendário da cidade onde morava que engravatado sente culpa e dá dinheiro pro café. Ele particularmente só pedia pingado e um pãozinho mole pra comer debaixo da ponte onde morava e não queria sair de jeito algum)

Não há crianças de rua no trajeto onde passo com a concentração de sem teto. Há poucas mulheres. Na Praça XV eles passam o dia, a noite é nas marquises do prédio fodão da Previdência Social. Há pedintes nas escadarias da Catedral? No que consigo perceber, não. 

Mochilas abarrotadas de coisas e utensílios, vejo graduandos caminhando pelo campus, alguns moradores de rua declarados, outros fazendo couch surfing pra garantir um lugar seguro pra dormir. Muitos são de fora da capital, interior, passaram no vestibular com a ideia de que ir pra capital iria tudo ser mais tranquilo. O custo de vida é alto, a cobrança social é alta, a repressão policial é tensa, o olhar de asco do Outro é perfurante. Viver nas ruas porque não tem condições de se manter conforme a sociedade diz que é o mais adequado. Viver nas ruas porque não aguentava mais seguir conforme a sociedade diz que é o mais adequado. 

Talvez seja por isso que assistir um deles, os invisíveis, botando meia garrafa de vodka barata pra dentro em plena segunda-feira faça sentido nessa lógica de percepção.

03 junho 2017

como uma palavrinha muda tudo

A primeira vez que ouvi a palavra "dyke" (sapatão) em inglês foi nesse filme aí embaixo, nessa exata cena:


O ano era 1999, Garota Interrompida era um filme cotado ao Oscar de Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Atriz Coadjuvante com Angelina Jolie (Lisa Rowe, a lorona mercenária) e na cidadezinha vilarejo brejeiro onde eu morava apenas uma locadora de vídeo cassete (Urrum VHS, isso mesmo) disponibilizava o filme para alugar.

Detalhe, o filme ficava perto do balcão, aos olhos da atendente, porque a classificação etária do filme era de 14 anos pra cima, o que numa cidadezinha brejeira católica tradicional mineira quer dizer 18 anos.

Para locar o filme foi um custo, tive que esperar todo mundo que era cinéfilo naquele buraco pegar para então colocar entre tantos outros títulos que eu gostaria de ver, o filme que a Winona Ryder conquistou meu coração, mas cometeu uma gafe incrível em romantizar o livro (Fui saber disso anos depois, tá?). Filme locado, hora de esperar o momento certo para assistir, não poderia ser com a presença de minha mãe ou junto da melhor amiga de infância, haveria de ser um filme para se assistir solo, porque muita coisa tava me levando a entender que aquele roteiro ali serviria para alguma coisa na minha vida.

E serviu. Garota Interrompida mudou a minha vida aos meus 13 anos e meio.

25 março 2017

vivências maternas

Uma das vivências que gosto de ouvir de minha mãe é sobre como ela sobreviveu na época da ditadura, em plena juventude, no Rio de Janeiro, com DOPS fungando no cangote dos universitários e coleguinha de sala de aula sumindo a cada semana pra fazer um passeio sem volta.

Ela fala com certo orgulho que no local onde ela trabalhava - uma companhia de seguros conhecida até hoje - um dos chefes a elogiava sobre a organização informacional que ela conseguia ter com os funcionários de um setor inteiro e como tratar tudo de uma forma que todos pudessem resgatar depois. Numa dessas conversas que temos ela soltou que o mesmo chefe pediu para ela fazer um teste vocacional e o resultado foi bibliotecária (!!!), ela polidamente recusou, pois naquela época ser aproximado de Humanas era pra pedir pra estampar um adesivo de alvo ambulante pro governo militarista.

Minha mãe quase se formou em Economia, quase. Faltou 1 semestre para ela formar e os motivos para sair foram diversos - ironicamente os mesmos motivos que fazem muitos de meus colegas da biblio desistirem também - mas a falta de ter uma estabilidade política era um dos mais fortes. Ela não tinha certeza se continuaria no emprego até o final do mês, ela não sabia se o salário ia aumentar, diminuir, inflacionar, ir pro limbo cósmico, ser convertido em dólar, em dinares ou pesares, a incerteza econômica era certa. E ela estava se formando para isso.

Ela tinha seus 20 e poucos e mais anos, solteira, recém-saída de um relacionamento duradouro, morando sozinha há anos, sem apoio dos pais ou irmãos, se sustentando como dava em um emprego que de certa forma dava um pouco de certeza para ela (como pessoa, ela fala muito bem dos tempos nesse lugar), mas não de estabilidade emocional, psicológica ou financeira. Ela fazia o que gostava - chefiar um setor todo de controle de qualidade e depois subiu para alguma coisa no departamento pessoal e ordeira como era, fazia com que tudo saísse nos trinques pra não dar ruim depois.

E isso ela participava ativamente de reuniões, de CIPA, de conselho de sei lá o quê, da atlética da faculdade, mas o medo de travar conhecimento com militar era constante. Não era fácil ser mulher naquela época e muito menos hoje, as práticas de exclusão e repreensão são as mesmas, só muda os cenários.

Ela faz 66 anos hoje, bem vividos, sem muitas pendências, criou as filhas como dava, sobreviveu a casamento sem amor assim oooooh nossa vai ser pra sempre que romântico. Pela vivência dela me deu muitos exemplos do que fazer e não fazer, a principal referência profissional que tive dentro de casa foi ela, e agradeço bastante o apoio que ela tem me dado quando escolhi a Biblioteconomia como minha paixão. Creio que a lucidez dela me trouxe muitos caminhos para trilhar, mas também muitas dúvidas (aquela dependência nociva de achar que sempre estará no colo da mãe? Yep, me livrando aos poucos para meu bem e o dela), a força dela em batalhar todos os dias pra se superar perante uma porção de dificuldades também.

Então desejo a Karolent, a Entesposa um belo dia de Lite (Quem é nerd demais para decorar datas comemorativas na Terra-média, sabe do que tou falando), e que ela possa continuara florescer nesse mundo. Eu não sei o que faria sem uma mãe dessas.

20 janeiro 2017

incapacitação da epopeia estomacal

Como é estar nesse calor da powha, sofrendo de intoxicação alimentar há 6 dias?

Uma aventura.

Primeiro porque há responsabilidades e ofícios que preciso deixar em segundo plano, pois o meu aparelho digestório parece não concordar com o fato de que posso ingerir comida. Na verdade ele até deixa, mas me faz pular de onde estou para correr pro banheiro.

Segundamente há os gatos. Enquanto Zé Bunito se mantém fresquinho e bem alimentado lá na varanda, fazendo poucas aparições na sala, dona Bete Balanço virou um grude incompreensível de tanta fofurice. Se estou passando mal de dor, ela pula no meu umbigo, se tou tendo crise aguda e voando pro banheiro, ela não liga se a atropelo no caminho. Está sendo uma experiência cativante.

Aí vamos aos downsides. Eu preciso trabalhar e voltar pra rotina, não posso. Eu quero comer coisas gostosas de novo, não posso. Tendo pavor de ficar na minha cama por longos períodos de tempo? Óbvio! 17 dias de tornozelo ferrado me deram uma boa ideia de que nutrir amor pela cama pode se transformar em um pesadelo quando não se pode sair dela.
(boa ideia para plot de terror...)

E há a situação incômoda de alternância de líquidos: soro, chá preto, suco de goiaba, água muita água. Não tá ajudando. Pra piorar, parece que o volume de marcações no meu nome no Facebook e Instagram que incluem desconto, sorteio, amostragem de comida pornograficamente awesome vem aumentando. Isso não é legal, isso é minha ideia pessoal de castigo pós-moderno. Isso e ficar de cama.

Em 6 dias de contemplação de minha existência ínfima nos esquemas do universo, deu para se notar:

1) são 101 azulejos inteiros dentro do meu banheiro, o que coincide com o número do meu apartamento. Uma boa coisa.
2) foram 6 dias de pedir arrego (literalmente) e perdi 2,5kg. Não é uma coisa boa.
3) maratona de Supergirl sei lá porquê (sim, eu sei, Katie McGrath!), pra emendar com Merlin da BBC (Malhação Medieval) - veredito: esperando os próximos episódios de SG, não me empolguei com Merlin.
4) a escolha de quitutes para comer!! Muita calma nessa fucking hora!! Nada com laticínios, nada com fritura, nada com muitos açúcares, preferência para coisas que hidratam. Sinceramente, já me sinto no purgatório.
5) se completar 7 dias, é porque perdi a aposta com a Samara Morgan, minha maninha dark imaginária que só as piadas internas entre Trentonildo, tio Mary e Evil D podem decifrar.
6) as crises agudas são de madrugada, logo adivinha quem está no regime de cochilos de 20-30 minutos? Adivinha qual cérebro já fritou no 2° dia ao ter os esqueminhas de vigília bagunçado? Olha só como estou feliz em não dormir direito?

Para ficar melhor, os servidores municipais de greve (e dou toda razão e apoio a todos!), logo os postos não estão funcionando como esperado. Tentei não deixar o lado hipocondríaco dar o ar das graças e só googlei sobre como fazer soro caseiro e manter repouso em crises de dor. É bem provável que essa *bleeeeep* toda se vá da mesma forma que costuma ir, pro vaso, depois descarga. Agora que dia que acaba, eu não sei mais. Tava otimista ontem, e hoje de madrugada senti as dores voltarem. É a fucking vida tirando os limões.

Tive uma dessas em 2011, longe de casa, na ocasião descobri a minha alergia a bacon de forma nada agradável. Vamos ver se agora o corpo vai dizer: "nope nope nope fucking nope!" pra alguma coisa, tá entre miojo, queijo canastra e molho de pimenta. Purgatório? Aqui estou.

Post sem gifs ululantes ou piadinhas sem graça, tou aqui na cama tentando me manter zen pra não entrar em modo rage berserker que me acomete quando estou incapacitada de alguma coisa.

Notícias dadas, soro tomado e metade de um dramin ingerido. Hora de voltar a bater cartão com patrão Morfeu.


13 janeiro 2017

[interlúdio] se acostuma com isso

Lado bom e ruim de chegar num ponto da vida que nada mais te surpreende:
Lado bom = evita muita fadiga e perda de tempo.
Lado ruim = nada mais te surpreende mesmo.

É só aceitar o Caos e seguir o fluxo.


26 setembro 2016

as filas da vida


Começa com uma rememoração bem bem lá do fundo do baú, uma lembrança que talvez a infância não entenderia o contexto pra saber se cuidar ou retrucar.

 A linguagem ali era meio que um treino pra socialização posterior - mas por que as pessoas não falam umas com as outras? As coisas seriam tão simples.

Lápis é lápis. Caneta não pode usar, só os adultos. Giz de cera já não serve, porque a Educação Infantil passou e adiantada 2 anos no meio de uma turma de crianças já alfabetizadas assusta. E eu gosto de giz de cera pela textura, pelas curvas que dá pra fazer, o cheiro, a fragilidade de não poder deixar cair ou jogar de qualquer jeito dentro da mochila. A vida com giz de cera foi bem curta, mas rendeu desenhos como de uma menininha pastoreira que colori insistentemente com a cor azul, porque sempre amei azul, logo pela lógica infantil seria legal ter essa pigmentação a mais na nossa epiderme.

Aí vem as filas. Ou a linha de produção em massa em que somos domesticades.





Uma pra meninos. Outra pra meninas. Ordem crescente de tamanho. As maiores lá atrás, as menores na frente. Eu no meio, porque os 1,75m que queria enquanto crescia nunca chegou (é a genética né? Ela prediz tanta coisa! Será que previa a fila onde eu deveria ficar? Ou isso foi ssocialmente instalado?).

As filas se replicam durante a idade escolar, fila pro lanche, pro banheiro, pra cantar hino de 3 coisas que nem entendia ainda (conceitos de nação, estado e bandeira eram tão abstratos quando agora), fila pro médico, pra tirar foto 3x4 pela primeira vez.

A foto era ambígua. Não era é não sou de superfícies refletoras - aquele papo de espelho captar parte da sua alma continua circulando - preto e branco, sem detalhes de fundo como eu gostava de perseguir nas gravuras de revistas de viagem e catálogos de filmes que tinha em casa. 

O rosto de 6 anos de idade não me diz muita coisa sobre a diferenciação nas filas, mas me dá pistas de quem eu era. Parece ser a/uma Bruna, mas mesmo assim não Bruna. Parecia comigo, mas não familiar. Descobri cedo que fotografias poderiam ser boas formas de recolher pistas para o futuro.
(uma menininha com cara qualquer, dentes crescendo, cabeleira confusa e volumosa, presilha de cabelo para prender as madeixas, não pra me identificar como menina - aliás, não seria legal pensar que todo mundo já tinha uma ideia do que eu era? Porque eu tinha lá na fila, a do meu lado era de meninos, a minha era de meninas)

Socializar com os meninos da rua não me dava direito a ser como eles. E percebi que na escola, o fato de sempre estar na fila do lado deles não me deixavam jogar futebol, apenas vôlei, brincar com as bonecas da caixa, me refugiar numa revista em quadrinhos. Essas eram as opções. E eu achava que era vice-versa, os meninos não podiam mexer na caixa das meninas. Não podiam jogar vôlei no pátio (Porque a quadra era deles e era normal não é? os espaços maiores são deles, inclusive os banheiros tem mais coisa), na fila do lanche não podiam entrar na minha frente.

Eles podiam.
Agora o porquê ninguém me ensinou. 

Nos aniversários eu pedia caixas de peças de madeira ou Lego quando dava, meu pai foi felizardo em entender que passar muito tempo falando aos cotovelos de histórias fantásticas deveria ser extravasada em algum lugar mais produtivo. Primeiro conjunto de Lego: um astronauta em um planeta gelado.

Um boneco amarelo, de cara genérica, cabelo escondido pelo capacete enorme, um veículo para percorrer a geleira. Nenhuma curva, nenhuma acentuação corporal indicando qual fila ele possivelmente poderia se encaixar lá na escola. Por muito tempo foi brincando com ele e sendo direcionada por uma amiga imaginária bem marcante (sim, era uma moça bem gente boa) que a infância foi de boas.

Aí depois do acidente de bicicleta, a vida meio que deu uma guinada. O corpo começou a mudar, o rosto da 3x4 mudou muito na área do queixo, fui confundida por um menino na saída do colégio.
Porque estar toda ralada, queixo enfaixado, rosto inchado e um sorriso de experiência bem válida (e foi, nunca mais repeti o delito de descer a rua na bicicleta sem freio e verificar se as leis de Newton funcionavam mesmo) eram experimentações masculinas. Volta e meia um colega de turma estava quebrado, ralado, com roxo no corpo. Para a fila do lado era um troféu de: "fiz uma manobra no skate, não freiei o rolimã na hora, a bola me acertou na cara" - na minha fila era vergonhoso uma menina estar assim.

Insira aqui diversos motivos para uma criança de 8 anos não se acidentar por conta do bem-estar de sua saúde.

Insira aqui reprimendas por mal conseguir abrir a boca pra comer por conta da dor, mas contar animadamente que voara por cima do guidão como um super-herói.

E receber uma silenciada com aquela frase típica: "Você não é hominho pra fazer essas coisas. Não faça mais." - vejam, não veio da minha família, não foi alguém que me importava muito, mas aí que veio o gatilho pra tudo.

Eu não era "hominho", mas brincava como um, sabia me relacionar bem como um, entendia do mesmo universo deles, e mesmo naquele espaço da fila de "não pode tal coisa, pois é menina" eu fazia muito mais coisas que uma menina podia.

Isso dá uma autonomia tão perigosa que me achei no direito de trocar de fila um dia, no lanche, só pra ver se a tia gente boa do lanche me reconhecia e pedia pra mudar de fila. Ela notou, ela encheu a caneca de achocolatado, passou os biscoitos e me despachou. Foi bem cedo que aprendi que não tinha os mesmos direitos com quem mais socializava .

As censuras diárias de  gênero  fizeram parte da minha vida desde cedo num espiral looping que começava com a sensação que podia me sentir bem fazer algo, mas que socialmente não encaixava na denominação e gênero que me colocaram. Se aprende a valiosa lição que não se pode falar tudo que passa na nossa cabeça, não quando há outras pessoas por perto. Descobri que ser adiantada 2 anos na não me ajudavam nada em conhecer mesmo as pessoas e entender as duas filas.

Na família ficava esse clima de "logo ela  fica feminina, logo ela para de fingir que é homem" - tive sorte de não receber uma heteronormatividade compulsória de minha mãe na infância, mas foi mudar pro estado do pão de queijo pro pesadelo linguístico começar, ouvir o repertório de:
"Você é menino é?"
"Deixa de ser macho que não é certo menina fazer isso!"
"Sem brinco, vestido, melissinha? Cadê a presilha, batonzinho, a Barbie?"
"Não posso brincar com você, porque acham que você é homem."
"Não posso brincar com você, porque você é menina."
"Não pode ficar aí, porque vai achar que você tá aprontando."
"Oh menininho, opa desculpa era mulher? Nem parece."

Afinal de contas, o que eles estavam falando?! Sou uma pessoa primeiro, se a fila onde passei minha idade escolar primária dava a entender que sofreria limitações, teria deixado o anarquismo bater e bagunçar o sistema de filas.

04 setembro 2016

mapa astral dessa pessoinha aqui

Já que a tendência é saber mais sobre o mapa astral do que a cor favorita ou o sabor de sorvete favorito (Sou bem desse tipinho antiquado pelo jeito), fui verificar com que cargas d'água - e pun intented com essa chuva torrencial aqui nas imediações - o meu mapa astral era.

Meu interesse por astrologia não é tanto devido a divergências no discurso. Já tratei disso aqui nessa postagem e volto a repetir que pode ser muito bem uma forma de categorização baseada em repetição de estereótipos, ou pode ser verdade. Entre o verdadeiro ou falso, fico com a dúvida. Acredito, mas desconfiando, sempre.

Há também o problema de memória seletiva que meu cérebro costuma fazer quando apreendo informações vindas do mundo mais intangível do ocultismo. o que eu sabia de LeNormande foi pro limbo cósmico, o pouco da metodologia de tarot nem mais lembro (boas razões, obrigade, nunca mais) e o que mais ficou fixado mesmo foi a parte de chakras, pois foi o que mais tentei usar durante os meses de molho. Os sonhos nem mais tento fazer esforço, eles não costumam aparecer tão detalhados mais, mas continuo a interpretar bem o trem de energias pra até não me deixar cair no vórtice da Banalidade.

Até porque a reação que as pessoas têm quando falo que sou de Virgem é hilária. Todos pensam que sou control freak (tá, com minhas atitudes sim, quem vai pagar as contas, receber ordem de prisão ou outras coisitas a mais sou eu), crítica ao extremo (ooooops), tenho T.O.C. (quem já entrou no meu quarto sabe o quão isso é mentira) e possivelmente vou surtar a qualquer momento por questões mínimas (nope, se é pra surtar é com a metafísica, isso sim merece ser digno de dramaticidade). Se fosse ESSE o caso.

O caso aqui é que eu não entendo essa linguagem, então fico só com comparações aproximadas de vivências. Por exemplo, vivência familiar, de amigos, de colegas de trabalho. Mas sinceramente não dou muito crédito pra isso pra estabelecer uma percepção de personalidades.

E aí entra a diferença de metodologias: recorrer ao mapa astral da pessoa dá um embasamento quase milenar para as atitudes da pessoa (Oi? É isso mesmo produção?), já eu prefiro perguntar qual a cor e o sorvete favorito. Alguém que ama verde e gosta de sorvete de morango significa uma porção de coisas pra mim.

Fiz esse trem aqui: Astro Cafeastrology

Qual é o problema de ter ascendente em Aquário? É um crime? O Vênus em Libra que confundi com o Plutão em Escorpião (Mas que por definição parecem a mesma coisa, mas anyways, explica o negócio de ter interesse em coisas nada convencionais e já ter sido admoestada pelo meu modo de apreciar sexualmente as pessoas com quem me relacionei) equivale a alguma coisa bem assim drástica? Librianes que conheci ou são super zen, adoram festa e animar as pessoas ou são totalmente da pá virada e ciumentos. Não consigo me ver em nenhum desses lugares. É pra interpretar assim? Ou tem um manual? Quede então?

A tr0llice é por ter Lua em Leão? É isso? Não é por conta de ter que usar o sarcasmo e fazer piadinha infame pra eu me sentir mais segura ao redor das pessoas nem por autodefesa? Dizem que Leão é líder natural, e super dramático (Sim, teoria comprovada dentro da família), mas como isso funciona quando é uma pessoa que se sente mais à vontade no backstage e tem pavor de dramalhamice?

Nem sabia que Lilith tava no meio, não sei o que os números significam - então nem irei opinar - o Mercúrio (Que por default é o deus grego da trapaça e das viagens, mas também o cara que simbolizava a esperteza, não raciocínio) em Virgo pode até ser alguma coisa, mas ainda sim me sinto bem por fora.

Então para a posteridade, quando estiver voltando a ler esse registro, dê para fazer a comparação que o mapa astral fazia sentido. Ou não. Tudo isso pra mim parece grego. Sério.

29 maio 2016

interlúdio

Toda vez que me senti mal com tudo na vida, me convenço que é só ter paciência, esperar um pouco que amanhã sapowha muda tudinho como num rollback de fase.
(ou resetar uma instance)

Porque tá foda de suportar e não ter vontade alguma de querer me cuidar... Mas tem né? Tem que aguentar o tranco, porque ninguém vai fazer isso por mim.

Preciso de uma parada na rotina maluca, preciso me curar, preciso me proteger, tá difícil.

Mas amanhã melhora.
Tem que melhorar.


06 março 2016

coisas que a gente não fala

"Anjo da Morte" por Evelyn De Morgan (1897)
A Morte, assim como qualquer coisa que envolva o Corpo acaba se tornando um tabu tão fechadinho numa redoma de adamantium que poucas pessoas que já conheci nessa vida de escriba se sentiram à vontade para sentar e conversar por horas sobre isso. Eu como boa pesquisadora desde que me entendo por gente, acabei me interessando por esse negócio (o corpo e tudo que vem envolvido nessa temática) por razõesmeio extracurriculares da minha própria natureza questionadora.
(Sabe o negócio de: "como funcionam as coisas?", então, o corpo humano pra mim é a caixinha cheia de engrenagens mais perfeita e misteriosa que já botei os olhos)

Tem gente que tá acostumada com essa perspectiva nefasta - gente que já viu a Dona Muerte de perto ou que teve experiências próximas com a perda de parentes, amigos, etc - e conversa de boa, mas mesmo assim sinto que o assunto não é lá bem tratado como deveria.

Já havia mencionado aqui no blog sobre algumas coisinhas sobre isso e como afeta diretamente a minha forma de ver o mundo, mas quando acontece muito perto, o mundo meio que para e revejo uma porção de coisas que estão erradas. Porque é exatamente isso que a Morte causa nas pessoas vivas: o questionamento incessante de que não estamos vivos completamente.

Para ler mais sobre isso tem esses links aqui [x] - [x] - [x] - [x] - [x]
Tem essa animação irlandesa MUITO legal: [x]
Emilie Autumn trata dessa temática com maestria: [x]

Alguma hora tudo isso que chamamos de corpo biológico vai parar de funcionar. Algum dia toda a energia que mantem essa estrutura intricada vai falhar e será mais um nome na lista da Dona Muerte. Às vezes o processo será apressado por inúmeras razões, medo, dor, culpa, tristeza, e por aí vai. E é aí que o tabu se torna mais afunilado, porque ninguém fala sobre suicídio.

Não sei da onde vem tanto terror pelo tópico, mas pelo que entendo em ler algo nas pessoas é que elas não exteriorizam esse pavor sobre suicídio. Por muitas vezes quem se mata é menos vítima do que culpado. A dor que fica remoendo as pessoas que ficaram para testemunhar esse ato de profunda responsabilidade - porque se matar está entre ser algo extremamente são e lúcido em certas circunstâncias, ou algo não-planejado e espontâneo. Fazer isso de forma abrupta e sem motivo algum é o que mais aflije pra quem fica. Da mesma forma que muitos classificam suicídio como na etimologia da palavra do latim, sui, "próprio" e caedere ou cidium: "matar", mas na minha teorização todos os dias estamos praticando um ato suicida contra nosso corpo.

Querem exemplos? Hábitos que prejudicam a normalidade de funcionamento do organismo: bebidas alcóólicas, drogas, cigarro, hábitos alimentares, falta de exercício, estresse demais, problemas psicológicos, ter uma carteira de habilitação...
(Oh vocês sabiam que acidentes de carro matam mais que armas de fogo no mundo inteiro? Então quem está atrás do volante pode ser considerado um suicida/homicida em potencial do que uma pessoa que possui porte de arma de fogo)


02 março 2016

preparação tática sem danos (colaterais graves)

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"that you're alone and you're lost in a forest and no one's giving you the fucking map and where the hell are you? accept that you can't go back because you would be doing something karmically (impossible?) and you just have to go forward..."


31 julho 2015

f-u intuição ilógica

Sabe a postagem anterior da Lady Murphy com a sensação do vai dar merda?
Pois é, deu. Só que não foi pro meu lado, foi pra Entesposa.
Por culpa de uma torneira aberta por falta de água no condomínio onde ela vive, inundou parte da casa (quartos, sala e cozinha principalmente. Milagrosamente o canto do Hankloud Strife, o cachorro ilusionista, estava intacto. Creio que ele seja a prova-dágua) e por pouco não inutiliza 70% dos móveis.

E a mania dela não ligar para avisar que está precisando de ajuda está me deixando ligeiramente irritada - não só com ela, mas comigo mesma, porque repito esse comportamento absurdo sem querer como forma de me proteger de outras pessoas e suas intenções (boas, ruins, whatever).

E aquele medo irracional que ela possa também estar sofrendo do mesmo mal de família que a intocável avó materna. 

Magnífico, agora vou ter que re-retirar o que disse antes dos sonhos.
O chato que tive na soneca inesperada de tarde era uma casa bagunçada, tudo revirado em cima de uma cama, e meia dúzia de gatos pulando em cima de mim (estava dormindo na cama com alguém que meu subconsciente cisma em trazer em lembranças), miando e arranhando de leve meus braços.

F-U ilógica da intuição! F-U!
(Isso é demais pra minha cabeça prática, it's so fucking too much!)