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31 agosto 2013

cartas, lots of cartas

Ainda as tenho. Bem guardadinhas em um envelope enorme com um cartão impossivelmente mais enorme ainda, elas estão lá, em tinta azul, com a caligrafia bonita e redonda, com muitas palavras. Muitas.

Por um bom tempo eu as evitei para não me lembrar demais - essa benção de memória boa para detalhes jamais foi encaminhada pela minha pessoa, às vezes desejo ter uma amnésia total e só lembrar do meu nome - mas as palavras escritas estão lá, grafadas para sempre nessas cartas já amareladas, tão cheias de recordações - e não tenho coragem de me ver longe delas.

Quando você passa muito tempo se correspondendo com uma pessoa, acaba criando uma rotina de co-dependência de assuntos, algumas dessas cartas continham mais de 5 páginas, narrando literalmente um diário semanal de duas pessoas separadas por mais de 420 km e 21 horas de viagem. Estranho foi ver como consegui abrir a pasta com as cartas e dar um fim nelas como elas deveriam ter, a memória que tenho desses anos de trocas de correspondências são como flashes de lembranças, nada muito sofisticado, felizmente naquela época (Quase 14 anos atrás) não havia tomado para mim a irritante habilidade de relevar as palavras escritas acima das faladas - agora, brutalmente, faço o contrário.



Essas foram fáceis de atear fogo e vê-las queimando aos poucos. Essas foram o término de algo que eu sabia há muito tempo que não iria a lugar nenhum e por incrível que pareça, moro agora praticamente a um bairro de distância da pessoa querida que estava dividindo sua vida em palavras, envelopes e selos comigo. Curioso isso.

Dizem que quando a gente vai ficando velha, vai exercitando a reminiscência com mais afinco, ao ponto de se tornar uma obsessão pela tal coisa. Sempre soube do meu vício com o pensar demais, esperar demais, sentir demais, falar de menos, expressar menos, tentar menos, porque quando o assunto é emocional, meus trilhos saem da rota com tanta facilidade quanto um trem desgovernado. Ainda não sei como lidar com isso, ainda não aprendi, acho que nunca vou conseguir exatamente a fórmula para controlar essa avalanche de memórias que me irrita mais do que auxilia.

Com o passar do tempo as reminiscências continuaram de outras formas, as cartas diminuíram - talvez eu tenha desencorajado qualquer um de manter contato prolongado comigo, talvez o email ajudasse na comunicação bem mais fácil do que os Correios - mas há um lote de cartas que mantive tão preso a mim que ao abrí-lo há alguns minutos atrás, apenas consegui captar as memórias boas. Curioso isso, já que meu modo padrão é redigerir as minhas falhas primeiro e depois me entregar ao momento lindo de reler algumas cartas especiais. Elas estão aqui no meu colo, com adesivos chamativos, palavras decifradas que só eu poderia entender, piadinhas infames, nonsense básica, cumprimentos verdadeiros, promessas de visitas que foram concretizadas, elas me deixam feliz, me fazem sorrir mesmo depois de muito tempo, me fazem lembrar que há 7 anos atrás eu não era ninguém (E continuo não sendo muito, mas teve upgrade de babaquice e algum tipo de conquista realizada). E as cartas me lembram aonde eu errei: foi por não ter evitado o trem desgovernado (De novo e de novo!).

Essas jamais irão encontrar o fogo ou qualquer outro meio de descarte seguro, essas me lembram que mesmo com tanta porrada levada pelo Destino, há Esperança. Não precisa ser concreta e imediata, mas me lembram que algum dia, nessa minha vida, eu fui feliz, verdadeiramente feliz, só não sabia como lidar com isso direito. E ainda não sei, acho que nunca vou aprender e possivelmente tentar após tanto tempo pode ser um plano razoável (mas ainda plano, não realidade). Amanhã eu posso estar morta, amanhã eu posso estar viva, amanhã posso ter a coragem de pegar o telefone e ligar - porque acho que cartas não constituem mais um modo seguro e confiável de se manter uma conversação, a escrita pode trazer mais dúvidas do que acertos nesses casos), mesmo sem saber o que falar. Talvez eu comente das cartas (mas não são elas que me impulsionam a rememorar quando há essa trava de segurança própria me dizendo para sequer chegar perto), talvez eu seja bem sucedida e há os outros "talvezes" que me assuntam tanto. E eles vão continuar aí sendo "talvezes" porque sei que não estou preparada ainda para receber a carga enorme de reminiscências envolvidas em todo o processo da escrita.

As cartas vão dormir comigo hoje, porque quero lê-las antes de adormecer. Meus sonhos não estão me sinalizando exatamente o que fazer ou como ou quando, mas me dão certeza que o caminho não se perdeu, a trilha no meio da Floresta, bem ali do lado da Estrada com a enorme pedra fincada entre os caminhos, não é tão assustadora e silenciosa. Também sei que tiros no escuro irei escutar de vez em quando (Alguns até tentarei dar, como essa postagem boba às 3h da manhã), mas já é alguma coisa, qualquer coisa.

Então para finalizar: eu ainda tenho suas cartas, conservo suas fotos e mantenho tudo que você me ofertou bem perto de mim. É onde me sinto bem, mesmo sabendo que nada vai ser o mesmo, são as únicas palavras que posso ler e rememorar, que não me fazem perder o sono a noite e minha concentração de dia. Elas, assim como você, me acalmam e aprendi da pior maneira possível que é mais importante ter paz de espírito primeiro para então ter a mente limpa e o coração puro. I'm no angel, you know that.

E um dia de cada vez.

Esse post criptografado foi patrocinado pelas deusas Nêmesis e a tal da Insônia, que anda muito em voga esses dias, mas se não tiver uma assessoria de marketing, tá fudido...

Ps: Há cartas que gostaria que nem tivessem existido, essas foram poucas. Foram para o fogo também, junto com a maldita Gramática Ilustrada do Português. Queimei sem dor e piedade!

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